Até já.
O telémovel toca. Número privado. Normalmente não atendo, mas como pode ser trabalho...
- 'Tou?
Não é trabalho. Antes fosse. A conversa inicia-se.
Ao fim de...
5 minutos, começo a ter de me esforçar para manter a concentração na voz do outro lado;
7..., estou distraída; a minha atenção vai e vem; disperso na conversa alheia que se desenvolve à minha volta;
10..., reviro os olhos; penso no que está em falta no meu frigorífico e escrevo, mentalmente, uma lista de compras;
11 minutos, digo 'tá bem então... depois falamos; não resulta; começa a ser fisicamente doloroso;
13 minutos, reviro os olhos, afasto o auscultador da orelha e respiro fundo; aproximo novamente o telefone do canal auditivo; confirma-se: a conversa é dolorosamente desinteressante;
16..., penso e se, subitamente, eu ficasse sem rede?
17 minutos, ou sem bateria?
19..., desespero e fecho os olhos;
22 minutos, começa a gerar-se um barulho ensurdecedor na minha mesa, no balcão e no café inteiro; ocorre-me que é melhor aproveitar a deixa e digo que não estou a ouvir nada bem e que é melhor falarmos depois, receando ao mesmo tempo que me peça para sair do sítio onde estou para conseguirmos falar melhor; felizmente não;
23 minutos; desligo; penso que se fosse a Ally McBeal apareceria nesse instante vestida de anjo a cantar uma enorme, enormíssima, Aleluia (e mais um Jesus, Maria e José) no café cheio de gente.
Pergunto-me porque é que mantenho certas amizades. Amizades é como quem diz; o que eu pelos vistos mantenho é o contacto com pessoas de quem já fui amiga. Não sei para quê. O tempo passou, as vidas mudaram, os interesses são outros. Eu quero lá saber das mobílias novas, dos arranjos do carro e das primas internadas.
Já não temos rigorosamente nada para falar.
1 Comments:
Do meu ponto de vista, o mais estranho é precisamente o inverso: sinto-me mais perto de pessoas que vejo duas vezes por ano do que daquelas que aturo todos os dias...
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