sábado, maio 20, 2006

Ai Portugal, Portugal...

Levantei-me, arranjei-me e saí.
Comprei o jornal no quiosque do costume, atravessei a estrada, entrei no café e o Sr. António disse «bom dia, menina» ao mesmo tempo que me apresentava a bica. Devolvi-lhe o cumprimento e sentei-me a folhear a actualidade. Nem dois minutos haviam passado, quando o Sr. António

- Ó menina, então não vai ao estádio?
- Desculpe...?
- Ao estádio! Fazer a bandeira! Não vai?
- Hmm... Não.
- Olhe que devia ir... deve ser bonito de se ver... e eles querem lá as mulheres todas! E olhe que até vai dar na televisão!
- Pois, parece que sim, mas não vou...
- É pena... Devia ir, devia ir...

Deixei o Sr. António a publicitar a bandeira humana a todos quantos entravam no estabelecimento. Fui meter gasolina. Estranhei a quantidade de carros que estavam na bomba mas não consegui relacionar o facto com coisa nenhuma. Pelo menos nos primeiros cinco segundos. Depois comecei a ver mães, filhas, filhos e pais vestidos a rigor. Camisolas encarnadas, o padrão da bandeira estampado nos lenços atados à cabeça e nos cachecóis pendurados ao pescoço (que, em dias como o de hoje, em que o tempo está fresquinho e tudo, não fazem calor nenhum). Comecei a ficar enervada com aquilo. Despachei-me o mais depressa que pude, apesar da fila em que se pagavam sandes às meias dúzias

- Ó Rosa, traz aí mais duas de carne assada porque não sabemos a que horas é que vamos poder comer...

garrafas de água, lenços de papel, latas de cerveja e, imagine-se, até se pagava gasolina.
Quando abandonei o posto de abastecimento apanhei um trânsito desgraçado para voltar para casa. Confesso que não sei se teria alguma coisa a ver com a deslocação em massa para a Cruz Quebrada mas, já que tinha um bode expiatório, assumi que sim. Enervei-me outra vez. Quando tornei a sair para ir almoçar apanhei mais trânsito. Ia começar a praguejar novamente contra a mais bela bandeira do mundo (?), quando percebi que estava metida na fila indiana de um casamento para o qual não tinha sido convidada. O condutor da frente, não me reconhecendo como elemento da festa, desacelerava, à espera de conseguir ver quem vinha atrás de mim; e o condutor à frente dele abrandava também, na tentativa de perceber o que se passava para trás... e eu ali, entalada naquela palhaçada. Tive vontade de os mandar para... o Estádio Nacional.
Mas agora a sério. Com um bocado de sorte, as mulheres portuguesas fizeram a bandeira dos pagodes chineses, tão na moda desde o Euro 2004. E com mais sorte ainda fizeram a aberração completa, que para além dos pagodes no lugar de castelos conta com um novelo de lã no lugar da esfera armilar. Se assim foi, eu calo-me já e páro de dizer mal. Porque se eu vivo num país que trata a sua bandeira desta maneira e em que se arregimentam milhares de pessoas para torrar ao sol numa tarde de sábado, eu só poderia ter tido a merda de manhã que tive.